diretor criativo
Mari: Ri, como será esse projeto?
Ricardo: Bem… a ideia é eu e a Rita darmos a conhecer os espaços de trabalho e pessoas das mais variadas disciplinas. (…)
Mari: Nossa, que legal!
(excerto da conversa entre Mari & Ricardo)
“Tudo tem um início” – já o dissemos. E foi à conversa com Gezo Marques, artista e diretor criativo\d’arte, que iniciámos este novo projeto. No dia da primeira publicação partilhámos a felicidade deste começo nas diferentes redes sociais. No Facebook surgiram likes, reações, comentários… num deles Mari escrevia: “Marcelo Lourenço, sugeri seu nome para ser entrevistado pelo meu primo Ricardo e pela Rita. Veja o trabalho deles com o Gezo.”
A prima Mari viu, gostou e ditou o desafio. “Rita, vamos convidar o Marcelo para participar na LIDA? Sim, vamos!” Enchemo-nos de ousadia e fizemos o convite a Marcelo Lourenço, diretor criativo da agência de publicidade Fuel, que aceitou de imediato.
Numa dessas manhãs onde o Verão mostra o que vale, rumámos à brisa fresca que se sente junto ao porto de Lisboa, onde a agência Fuel está atualmente instalada. Recebeu-nos um sorriso que nos guiou até aos bastidores do mundo da publicidade e que nos acompanhou ao longo de toda a conversa. Percorremos o open-space onde nascem as ideias, branco como a folha de papel que nos estimula a criar, até chegarmos ao pequeno “escritório de vidro” onde Marcelo e o também diretor criativo Pedro Bexiga trabalham como dupla.
Ao sabor do café, a conversa fez-se de histórias, percursos, referências e sobretudo, de bom humor, pautada pelas deixas tão subtis quanto cúmplices de Pedro Bexiga.
Marcelo Lourenço contou-nos a sua relação com a publicidade, falou de prémios, de inspirações, de pizzas com ananás! Falou do prazer de escrever e desenhar, e do Batman – vício de sempre.
Entre estrelas de cinema e super heróis, conhecemos Marcelo Lourenço, que se não fosse o que é, seria detective, ou espião… mas Marcelo “é assim, e está tudo bem.”
Claquete, luz, câmara, ação!
slideshow no escritório de marcelo lourenço
quem é o marcelo lourenço?
Quem é o Marcelo Lourenço? (risos) Essa é uma pergunta que vai ser propriamente respondida para que daqui a 30 anos, quando o National Geographic fizer o programa: “Marcelo Lourenço… Herói ou Vilão?” (risos).
Bexiga: Não vou fazer comentários sobre isso (risos)…
Tem um vídeo dos The Doors – que são a minha banda preferida – onde o repórter pergunta o que cada um deles faz. Um fala “Eu sou instrumentista”, outro “Eu sou baterista” e o vocalista só responde “Jim”. O repórter pergunta de novo qual é a sua profissão e ele: “Pôh… nem eu sei direito o que eu faço!”.
Bom… sou publicitário, diretor criativo mas, basicamente, eu sou copywriter. O que eu gosto de fazer é escrever, apesar de desenhar muito, muito, muito! Quase tudo da minha vida está escrachado numa série que eu faço…
umas caricaturas.
Exatamente. Comecei de brincadeira e acho que, como quase tudo o que eu faço, eu tento fazer campanha, ou seja, conceitos que dão várias coisas e com aquilo vou-me divertindo e várias pessoas gostam.
Ainda ontem fui a um lugar onde costumo ir bastante. É uma garrafeira no Bairro Alto onde vão todos os publicitários da velha guarda e o Pedrão, que é o dono da garrafeira, falou: “Quando é que você vai fazer mais desenhos daqueles?” (risos).
Eu trabalhei dez anos no Brasil, em São Paulo, na Euro RSCG onde trabalhei com a Mari e um dia discuti com o meu chefe que era o dono da agência. Depois disso pensei: “O que é que eu vou fazer?”.
Estava com 28 anos, chegando aos trinta e como todas as datas redondas têm as suas crises, pensei: “Caramba aos 30 preciso de fazer alguma coisa. O que eu sempre quis fazer foi aprender cinema”.
Juntei todo o meu dinheiro e fui para os Estados Unidos, para Miami, onde tinha um grande amigo. Um dia, esse amigo falou: “Olha… um amigo meu de Portugal quer contratar um copywriter e eu acho que é você”. Mandou o meu portfólio por fax – tão velho assim! – (risos) e depois o Leandro Alvarez, que é hoje o vice-presidente da TBWA, ligou e falou “Vem” e eu vim. Seis meses depois ele saiu da agência e me convidou para ser diretor criativo com essa “besta” que esta aí do lado. Já lá vão… quanto tempo Bexiga?
Bexiga: Desde 99 não é?
Porque eu e o Bexiga funcionamos assim: eu sou o Conan O’Brien e ele é aquele que que fica no programa fazendo comentários… é ou não é Bexiga? (risos)
(gargalhadas do Bexiga)
Sou casado, tenho duas filhas que são a coisa mais fantástica do mundo.
E em linhas gerais é isso… não sei mais o que eu posso dizer, sem parecer mais trouxa do que eu estou parecendo. (risos)
quando nasceu esta paixão pela publicidade?
Eu escrevi um artigo sobre isso. Agora tenho escrito muito e tenho descoberto o prazer de escrever artigos. Desde que a gente começou a ter algum sucesso e ganhámos um Leão de Ouro, convidam-me para falar sobre tudo.
Ah… e sempre que me convidam, eu sempre escrevo e sempre me convidam de hoje para amanhã e eu sempre escrevo.
A revista Marketeer, me convidou para estrear a rubrica “A campanha da sua vida” e eu me lembrei que decidi ser publicitário aos doze anos porque tive uma professora de inglês maravilhosa que no último ano foi minha professora de português e foi aí que ela disse: “Acho que você gosta muito de desenhar, gosta muito de escrever, você gosta muito de falar sobre as coisas… eu acho que você estaria bem em publicidade”.
Tive alguns flirts com outras profissões, quis ser jornalista, quis trabalhar com cinema mas a publicidade sempre foi a minha “esposa”. Eu já escrevi um livro infantil “O livro dos grandes direitos das crianças” mas a publicidade foi sempre o lugar onde eu acho que não só eu me divirto mas onde eu sou melhor, onde eu consigo fazer coisas que eu acho que estão acima da média das outras coisas que faço.
Bem… eu escrevi esse artigo por uma coisa muito engraçada, talvez a coisa mais engraçada que já tenha acontecido em toda a minha carreira. Eu fiz um filme com essa besta…
Bexiga: Qual besta?
… contra o racismo. Era um filme que se passava dentro de um avião. Tem um rapaz negro sentado na cadeira, depois chega uma velhota assim com 100 anos e senta ao lado dele. Chama a hospedeira e diz: “Eu não vou viajar ao lado de um negro”. Aí a hospedeira fala que a classe económica está lotada e ela fala: “Olhe… nem quero saber, dê um jeito”. Ela vai para dentro, vai falar com o capitão, volta e fala: “O capitão disse que é mesmo ridículo, é mesmo impossível um passageiro lesado viajar ao lado de alguém tão desprezível…” e convida o rapaz negro a sentar na primeira classe.
Esse filme foi shortlist em Cannes, ganhou Eurobest, ganhou Clube dos Criativos, ganhou várias coisas em 2001.
Bexiga: Antigamente quando escrevia “despicable” na internet aparecia logo o filme agora aparece o “Gru, o maldisposto”. (risos)
Agora há um esforço da publicidade em conseguir que as pessoas vejam no YouTube. Esse filme já colocámos há quatro anos – para a gente fazer um portfólio – e sem fazer absolutamente nada já tem quase um milhão de views.
Mas como estava dizendo, aconteceu uma coisa muito engraçada há 5/6 anos atrás. Eu e o Bexiga estávamos em Cannes e um dia encontrámos o Ricardo – aquele menino de barba ali e de camisa azul. Era nosso estagiário na Euro RSCG, nós tínhamos passado para outra agência e foi o ano em que ele e a dupla dele, que agora é sua esposa, foram selecionados para serem os jovens criativos em Cannes. Aí nós encontrámos os dois e o Ricardo falou: “A Andreia tem uma coisa para dizer a vocês… conta lá, o Marcelo vai ficar contente. Diz-lhe. Diz-lhe” e ela: “Olha, eu vi o filme de vocês na televisão, o do avião, quando tinha 15/16 anos e pensei… é isso que eu quero fazer da vida. Quero trabalhar em publicidade para fazer coisas assim”.
E o artigo que escrevi para a Marketeer chama-se “A publicidade segundo a dona Denise” porque foi quem me incentivou a ser publicitário e a melhor campanha seria aquela que eu acho que deixaria dona Denise orgulhosa. E essa do avião por tudo o que ganhou mas, principalmente, por fazer alguém querer ser publicitário por causa dela acho que é um elogio que me deixa muito orgulhoso.
o marcelo acabou de falar que a ilustração e a escrita são duas paixões. como articula essas duas paixões com o seu trabalho?
Para mim, é muito mais fácil explicar uma ideia fazendo um desenho. Muito, muito mas muito! Eu até chateio demais os diretores de arte porque, às vezes, eu fico desenhando: “Ah! eu acho que tem de ser assim… eu acho que tem de ser assado…”
Bexiga: Mas eu não ligo nenhuma…
Ele não liga. (risos)
Eu vivo fazendo caricaturas…
sim. a mari contou-nos que desenhava todo o mundo da agência.
Exatamente. Eu trabalhei com a Mari quase quatro anos e nessa altura (risos), eu vivia desenhando o meu dupla que era o Daniel, também amigo da Mari. Desenho a desenho. Depois parámos de trabalhar juntos e um dia fui jantar na casa dele. Começámos a falar sobre esses desenhos e ele foi buscar um calhamaço… talvez uns 50 desenhos! Já o Bexiga, eu faço os desenhos dele e ele joga fora (risos) mas de vez em quando ele acha uns aí e fala: “Olha esse aí!” (risos).
Eu passo muito tempo da minha vida profissional ouvindo coisas. Alguém a explicar como é a campanha, alguém a explicar porquê que a campanha foi chumbada, alguém que me está contando uma ideia… e eu tenho um vício… fico desenhando o Batman. A quantidade de Batmen que andam espalhados por aí é imensa. Hoje, como sou eu que estou falando ainda não desenhei nenhum mas se eu estivesse escutando vocês eu estaria desenhando o Batman e ouvindo o que vocês estariam dizendo.
É quase uma extensão natural mas…. eu acho que eu não seria feliz desenhando profissionalmente. Acho que não seria e percebi isso muito cedo. Fazer o mesmo desenho duas vezes é um saco e não era a minha cena. O que eu gostava mesmo era de escrever e o desenho era uma maneira de me ajudar a escrever melhor.
Acho que escrever profissionalmente me satisfaz muito mais!
porquê portugal? porquê ficar por cá?
É engraçado que eu tenho ouvido essa pergunta tantas vezes (risos)… tantas, tantas vezes.
Bexiga: Está impedido de entrar no Brasil. (risos)
Eh! Eu sou procurado por um crime que eu não cometi que nem “O fugitivo”. (risos)
Vocês já foram a São Paulo? Eu não quero aquilo para mim. Não quero trânsito, não quero violência… não quero. Eu sou do interior do estado de São Paulo mas fiz 10 anos da minha carreira profissional em São Paulo… sou um paulistano adoptivo mas como referi, não quero aquilo para mim.
Eu só não fiz mais coisas em Portugal porque não consegui, porque eu tive todas as oportunidades.
Cheguei aqui para ser redator sénior – como se diz no Brasil – e seis meses depois falaram: “Quer ser diretor criativo?” “Quero. Bora lá”. A coisa correu super bem mas um ano depois me desentendi com a agência e fui para a Leo Burnett que é uma agência que ganhou todos os prémios na altura. Aí… “Quer fazer coisas para ganhar prémios?” “Quero” “Quer fazer coisas de verdade, grandes campanhas?” “Quero”.
Fui falando “Quero” para todas as coisas e… “Quer começar uma agência nova do zero – a Fuel?” “Bora lá”. E a agência começou com quatro pessoas e um cliente – a Volvo.
O Bexiga e eu trabalhávamos para a Euro RSCG, onde fizemos grandes campanhas como a campanha da TMN “até já”, quando a Volvo abriu um concurso internacional para uma nova agência cuidar da conta.
Fomos para o concurso e ganhámos. Eu, o Bexiga, a Marta Kadosh e o Miguel Barros que é o CEO. A agência começou há sete anos, foi crescendo e somos a número 1 desde o ano passado.
Então, porque não vou embora de Portugal? Eu acho que há muita coisa para fazer aqui… e eu acho que o meu caso é um caso de sucesso e de muitas oportunidades. O Anselmo Ramos, foi quem me indicou para cá, (risos) disse: “Você tem de ir para Portugal. Se você for para lá nunca mais vai sair porque Lisboa é uma das cidades mais bonitas do mundo”.
E… Lisboa é o máximo, Portugal é o máximo. Apesar desta crise ser horrível isto vai passar, tem de passar.
Aliás, há dois anos atrás, tive uma proposta concreta para voltar para São Paulo e trabalhar com grandes contas, numa grande agência e na última hora vi que não… não queria, preferi ficar cá.
qual é a fórmula de uma agência que começou com 4 pessoas mais um cliente, se tornar hoje a melhor agência de publicidade?
Sabe o que eu acho? O segredo do sucesso da Fuel é que nós ocupámos uma vazio que existia no mercado. Nós tentamos fazer o melhor nas piores condições.
Em Portugal, há agências que entregam campanhas de hoje para amanhã mas fazem uma porcaria e outras que só fazem uma grande campanha se tiverem um ou dois meses para fazer essa campanha.
Nós tentamos ser o meio do caminho. “Tá bom! Vocês, realmente, precisam de uma campanha para daqui a dois dias? Vamos fazer o nosso melhor!”
Há agências que entregam grandes campanhas se ela for aprovada à primeira e há agências que fazem campanhas que são chumbadas uma, duas, três, quatro, cinco… dez vezes. O nosso ideal aqui é: “O cliente chumbou? Vamos fazer melhor. O cliente chumbou… vamos fazer melhor!” Se depois da vigésima vez, o cliente ainda não está satisfeito, vamos continuar tentando.
É super difícil tentar inspirar as pessoas assim mas depois, quando sai um trabalho que está acima da média daquele sector, nós nos orgulhamos pelo bom trabalho realizado.
sempre o melhor. é interessante estarem sempre a “lutar” mesmo depois de dez “nãos”, isso é fantástico.
E os clientes percebem isso. Acho que a pior coisa que pode acontecer para um cliente de uma agência de publicidade é uma agência dizer sim a tudo.
Muitas vezes, eu me chateio com os clientes e falo: “Vocês me pagam para eu me chatear com vocês, para eu tentar oferecer o melhor trabalho”. Quando dizem que querem fazer um filme com uma banana mas eu acho que precisam é de uma laranja… eu chateio, brigo e digo: “Eu acho que tem de ser laranja”. Mas quando alguém diz (e eu já ouvi isso muitas vezes): “Não. Chega. Muito obrigado pela sua paixão mas nós queremos mesmo uma banana” … então: “Bora lá fazer o melhor possível” e às vezes isso faz diferença… mesmo.
Esse espaço entre o “toma qualquer coisa” e o “tá bom, vamos lá tentar fazer isso bem feito” é o sucesso dessa agência.
Nós tentamos ser uma solução e não um problema e acho que isso é o sucesso daqui.
agora falando do espaço…
estiveram na expo, agora estão aqui. porquê aqui?
Isso tem uma razão muito prática.
Quando estávamos para fechar o contrato de renovação do espaço, à última da hora, o proprietário meteu algumas cláusulas que a agência não concordou.
O Público tinha este espaço disponível e o Miguel Barros que é o CEO, conseguiu que a gente viesse para cá e acho que é fantástico.
Eu moro na Expo e talvez o único lado ruim deste espaço é o tempo que, por vezes, demoro no trânsito. Mas também estou tentando ver o lado bom disso (risos). Deixo as minhas filhas no colégio e depois venho pela Avenida da Liberdade, Bairro Alto e… parece que estou sempre de férias (risos).
A diferença de morar em São Paulo e Lisboa, é que São Paulo não é uma cidade turística. Ninguém te pergunta onde está “não sei o quê”. Em Lisboa, você vê pessoas vendo Lisboa pela primeira vez. Então, chego aqui ainda mais feliz de morar em Lisboa o que é ótimo.
Depois tem esse visual à frente da agência. Parece que a gente está numa agência de uma série de tv americana… quem sabe em São Francisco com o porto, as pessoas correndo… eu acho que este novo lugar tem uma boa vibe.
o que considera essencial no seu gabinete em termos de qualidade espacial?
Eu não preciso de muita coisa. Aliás, estou sempre arrumando a minha mesa para ter o mínimo possível. Acho que quando saí do Brasil para cá, aconteceu uma coisa muito engraçada na minha vida.
Eu saí para ficar dois meses fora e voltei dois anos depois. Nesse período liguei para os meus pais e falei: “Aluguem a minha casa e vendam tudo o que está aí dentro”. Por isso, eu sempre estou tentando ter o mínimo possível… e ainda tem muita coisa! (risos)
que objetos não podem faltar?
Sempre folhas de papel de rascunho. Eu acho que é um desrespeito usar uma folha branca para ter ideias. Você tem que rabiscar, amassar, jogar fora, começar de novo.
Canetas. Sou fã de canetas pretas de todos os tamanhos e texturas e… que mais?
Bexiga: O laptop.
Sim… o laptop que está cada vez menor, assim como os meus emails (risos).
Há uns 4 anos, as pessoas que recebem os meus emails acham que eu estou gritando porque eu escrevo tudo em
corpo 18 (risos)
– parece coisa de velho que não consegue ler, né (risos) – mas é para escrever o menos possível nos emails. Primeiro escrevo em corpo 9, 10 ou 12 e depois
passo para 18.
Fica enorme e falo: “Tem de ser menor” e vou reduzindo (risos).
Então… folhas brancas, caneta preta, laptop e como todo o pai babão tenho de ter as coisas que as minhas filhas vão me dando. Eu tinha umas canecas super cool (risos) mas agora elas foram virando esses desenhos das minhas filhas (risos).
Antigamente, tudo o que você sabia sobre publicidade estava nos anuários e muitos ficavam aqui na mesa. Aliás, havia uma revista muito frequente nas agências que era a Archive… Bexiga tem umas Archives aí? Era a revista que quando chegava nas agências, todo o mundo parava, todo o mundo via e todo o mundo falava. E como todo o mundo na publicidade comprava a sua própria Archive, todas as revistas têm nome (risos).
A Archive é uma revista alemã trimestral que sai com o melhor da publicidade. É uma revista super visual e é muito comum na publicidade falar: “Vamos fazer um anuncio a la Archive? Só com o logotipinho e uma imagem?” ou então: “Pôh! Isso parece uma porcaria da Archive. Bota esse logótipo maior, assim não dá para ler”. Mas como saiu de moda porque tudo está no computador, a mesa vai ficando cada vez mais limpa.
Não contente em arrumar a minha mesa, eu estou sempre arrumando a mesa do Bexiga porque o lixo dele começa a invadir a minha mesa (risos)… e eu começo a jogar tudo fora.
Eu agarrei isso aqui (uma pedra da calçada) que serve para fazer um peso de papel.
Comecei a escrever mais um artigo sobre a publicidade viral e tem uma teoria, que eu gosto muito, de um cientista americano que é a “teoria da janela quebrada”. Ele fez uma experiência nos anos 60 em que pegou dois carros. Colocou um na pior zona de Nova Iorque, no Bronx, e depois colocou um carro igual na zona dos maiores “betos” dos Estados Unidos, em Connecticut. Claro que o carro no Bronx no dia seguinte estava todo arrebentado e o carro na zona dos “betos” estava impecável. Mas, o que ele fez? Ele foi lá e partiu uma das janelas do carro. Três dias depois, o carro também estava todo arrebentado em Connecticut! E a teoria dele era: a ordem das coisas é muito fácil de se partir, basta apenas uma janela quebrada.
A relação que eu gostaria de fazer com a propaganda da internet é: uma boa publicidade viral é “esta” pedra. Se a gente souber a hora e onde atirar, aquilo tudo pega fogo. O que essa primeira pedra precisa fazer é convencer todas as outras pessoas a, também, começarem a atirar “essa” pedra. Mas esta pedra que eu peguei na calçada segura as folhas (risos).
É engraçado que agora já não perguntam mas no início, as pessoas chegavam e falavam: “Eh! Vai atirar essa pedra na cabeça de alguém?” (risos).
falando de rotina, como é um dia normal aqui na agência?
Dia normal na agência é uma coisa difícil (risos). Eu queria… o dia mais feliz que eu tenho é quando eu chego de manhã, abro o computador, começo a escrever e ninguém fala comigo porque realmente é o que eu gosto de fazer.
Quando eu tenho de fazer mesmo uma coisa ou quero escrever uma ideia, eu chego muito cedo porque até às 10 horas / 10:30 o telefone toca pouco.
É engraçado, quanto mais você sobe, nessa ou em qualquer profissão, menos te deixam fazer o que te levou àquilo. Eu passo os dias respondendo emails, vendo campanhas que não fui eu que fiz, falando “mais para cá” ou “mais para lá”, falando com clientes ou internamente. Ser diretor criativo é um pouco virar o selecionador da equipa.
Aqui na agência, tentamos que as pessoas tenham qualidade de vida (o quanto se pode ter qualidade de vida nessa profissão). Ou seja, a gente ainda faz alguns fins-de-semana ou noitadas mas só quando é necessário e que isso não seja regra. Temos muitos criativos seniores que têm filhos, que chegam cedo, trabalham na hora de almoço e às sete horas querem ir embora. Acho isso muito saudável porque, isto é um cliché mas é verdade… ter ideias depende dos estímulos que você tem. Se você olhar sempre as mesmas coisas você vai ter sempre as mesmas ideias. O Einstein diz que é uma estupidez fazer sempre as mesmas equações, esperando resultados diferentes. Se você não muda a equação o que vem a seguir nunca vai ser diferente.
Estou sempre a dizer aos criativos que a boa publicidade é uma pizza com ananás. Porquê? Porque a pizza era sempre de queijo até um dia que alguém perguntou como ficaria colocando ananás em cima. Ou seja, é uma mistura que dá outra coisa nova. Muitas das ideias que realmente são diferentes, são aquelas que você olha e fala assim: “Pôh! Uma pizza com ananás em cima? Isso vai ficar horrível”. Mas depois dá outra coisa… é um sucesso e alguém pensa: “Como é que eu nunca pensei em colocar um ananás por cima de uma pizza?”.
Voltando à rotina… eu como qualquer gestor de departamento, passo muito tempo organizando as coisas, brigando por prazos, ou vendendo as coisas, ou revendendo as coisas ou olhando uma pizza e falar: “Falta aqui um ananás. Todo o mundo já fez pizza com queijo… vamos fazer pizza de outra maneira”.
É nos tempos livres, nos breaks, que eu vou criando as minhas campanhas. Porque, ainda assim, trabalho muito como criativo.
A Fuel nasceu em 2007, a crise estava começando e a gente sempre esteve com menos pessoas daquelas que nós deveríamos ter para trabalharmos mais folgados. Aliás, esse é outro aspecto da fórmula do sucesso da Fuel… todo o mundo tem sempre um grande projeto e mais outros. Acho isso saudável e não existem muitos tempos mortos.
Depois… há uma prolongação desse escritório que é a cozinha da minha casa. Acho que a minha hora mais produtiva é entre as 11:30 da noite e a uma e meia da manhã. A quantidade de emails que eu mando às duas da manhã dizendo está feita a campanha e a quantidade de respostas que o Bexiga me manda falando “Acho que está feito”, ou não é imensa (risos).
ao longo destes anos de fuel receberam vários prémios… a que sabe um prémio?
Ganhar um prémio é como… você ir à maratona. Você treina o ano inteiro, quando você finalmente cruza a linha de chegada é uma maravilha, mas depois já começa a pensar na próxima corrida. É fantástico e para a agência foi ótimo.
Estamos tanto tempo focados em criar as coisas que quando chega o resultado já estamos com a cabeça em outra. Então, os prémios são maravilhosos, mas vêm sempre com um delay, sabe? Mas é uma maravilha e eu percebo porque há muita gente na publicidade completamente viciada em prémios. E como qualquer coisa que vicia, há que tomar um pouco de cuidado. (risos)
A campanha não é uma coisa exata. Eu já fiz coisas que eu achava que iam ganhar todos os prémios do mundo e não ganhámos nada… Eu já fiz coisas que pensei que, se calhar, as pessoas nem iam perceber e são um mega-sucesso. Isso é, talvez, a coisa mais engraçada dessa profissão.
O Leão de Ouro que nós ganhamos em 2011 foi a prova de que eu só sei o que não ganha, o que ganha é um mistério. Foi uma campanha para a Amnistia Internacional, que saiu em anúncios de imprensa e em mupis, que são duas categorias distintas, julgadas em dias distintos. Nós nos inscrevemos nas duas. A campanha era praticamente igual, mudou um pouco o tamanho da letra. A primeira categoria onde são anunciados os vencedores é a Press, que eu acho que é onde a campanha vive melhor. A campanha não teve nada… nem ficou na shortlist. Eu fui para lá achando essa campanha o máximo, que ia ganhar tudo. Quando não ganhou, pensei: “Afinal não é o máximo. Oh Bexiga, você podia ter feito um layout mais bonito.” (risos)
Quando a gente manda coisas para concurso, realmente não precisa se preocupar em ver se a campanha ganhou ou não. Se ganhou, alguém vai-te ligar. Quando a gente saiu do avião em Cannes começaram a mandar sms. Era a shortlist, que já é uma grande vitória. E a gente foi comemorar: “Eh, shortlist! Eh, maravilha! … Ah, ‘tá bom!”.
Estava assistindo a uma palestra do Robert Redford falando sobre o Sundance Festival, que é um assunto que me interessa bastante e o meu telefone tocava, tocava, tocava… e eu desligava, desligava. Quando eu, finalmente, atendi me falaram: “Ouvi dizer que vocês ganharam um Leão de Ouro”… Foi uma coisa tão inesperada… Era mesmo o Leão de Ouro! Eu nunca bebi tanto na minha vida sem conseguir ficar bêbado como nesse ano. (risos)
Foi no Mupi que ganhou, mas é engraçado, a campanha é igual. Deixa ver se eu tenho aqui guardado. Ah! Está aqui. (mostra a campanha)
O fotógrafo João Pina fez esse trabalho fantástico. Pegou em shots dos presos políticos portugueses e encontrou-se com eles nos dias de hoje, para fazer exatamente a mesma fotografia. O Pedro me mostrou o trabalho dele e sentimos que tínhamos de fazer alguma coisa com isso. Todos os anos a Amnistia nos chama. Nesse ano falaram assim: “Faz trinta anos que a Amnistia existe e nós queremos comunicar isso, que esses trinta anos fizeram diferença.”.
Chegámos à conclusão que isso era a maneira perfeita de dizer “Essas fotos existem graças à PIDE (fotos antigas) e essas fotos existem graças à Amnistia (fotos recentes)”. Se não fosse a Amnistia não tinha nada aqui, esses caras tinham morrido.
A Amnistia adorou e aí foi convencer o João Pina, por várias razões, mas…
Bexiga: Sobretudo porque uma dessas pessoas é a avó dele…
É… ele falou: “Vou colocar a fotografia da minha avó?” E aí, foram um, dois, dez emails para ele, explicando o conceito, que logo percebeu que era sério. A campanha saiu primeiro em anúncio de jornal (eu por acaso acho que funciona melhor como jornal)…
mas foi imprevisível o resultado…
São júris diferentes, o presidente do júri é completamente diferente e é ele que dá o tom. Quem era o presidente nesse ano? Era o francês…
Marcelo e Bexiga em uníssono: O Oliver Altmann.
Uma das vantagens do prémio: tínhamos feito trezentas posições dos mupis no metro e as pessoas já conheciam mais ou menos a campanha. Quando ganhou o Leão de Ouro, a MOP, que tinha cedido o espaço, concedeu mais mil posições. Então, a avó do João Pina recebia telefonemas: “Ah, vi a sua cara no Porto” (risos). Acho que no final ela gostou.
É por isso que digo para darmos o nosso melhor nas coisas em que acreditamos – o mais cientificamente possível, com briefing, com pedido, mas depois tem uma parte da comunicação que é meio imprevisível, não é? Isso acontece em Hollywood também. Todos os anos os filmes lançam esses blockbusters que são um flop. Depois lançam filmes alternativos que caem no gosto, e aquilo “click!”, vira um sucesso. Aí chamam o realizador e pedem-no para fazer outro filme igual… e o filme não presta.
Eu sou um grande fã do James Bond, (tanto que sempre me dão posters, canecas e t-shirts do James Bond). O James Bond é uma fórmula de sucesso, mas eles vão mudando certos aspectos. O Daniel Craig, que é o último James Bond, é uma coisa completamente diferente do que era o Roger Moore ou o Sean Connery. Tenho a certeza que quando eles lançaram o Daniel Craig podia dar muito errado… eu achei aquilo horrível, na altura, mas também fui ver. (risos)
Há momentos em que eu digo: “Eu não sei porquê, mas isso vai funcionar. Tem alguma coisa me dizendo que isso vai funcionar.”
Uma das campanhas que a gente fez de maior sucesso agora foi a dos Jovens Criativos, com o Fábio Paim. Foi uma das campanhas em que alguma coisa me dizia que era especial. Eu passei essa campanha para o Márcio que está sentado ali, a Nuna e o Catalão, que é o jovem criativo que está ali e falei para eles: “Eu quero que vocês me tragam um problema, que eu me pergunte: Seria o máximo mas como é que vamos fazer isso?”
Esses são os melhores momentos do meu dia. Eu não quero coisas que eu já vi, não quero ver coisas que eu faria. Eu quero ver coisas…
quer-se surpreender.
Sim, eu quero ver coisas que eu diga “UAU!”
Quando eles vieram com esse conceito de colocar o Fábio Paim dizendo: “Eu joguei a minha oportunidade fora. Não faça como eu.”… pensei primeiro, como é que a gente vai achar o Fábio? Demorou muito tempo para achá-lo e quando, graças ao Facebook, conseguimos contactá-lo, eu pensei que contava a ideia e ele me dizia: “Você quer que eu vá para a televisão falar que eu sou um perdedor?” Para minha surpresa, ele falou: “Se é para ajudar os jovens, eu vou”.
E isso fez ele renascer como personalidade. Já foi chamado para o “Querida Júlia”, entrou no “Splash” das celebridades e vai lançar uma biografia. Na altura eu falei para ele: “Fábio, quero que aconteça com você o que aconteceu com o Robert Downey Junior. Fazia dez anos que Robert Downey Junior só aparecia nos meios de comunicação com aquela roupa amarela de preso falando em Rehab, não-sei-o-quê, não-sei-o-quê… apesar de ser um ótimo ator! Quando foi à “Oprah” contar a história dele há um produtor da Marvel ou da Fox que estava em casa assistindo e falou assim: “Esse cara é que dava um perfeito Iron Man”… E o Robert Downey Junior voltou a ser essa mega-estrela”.
Era isso que eu queria. Queria que as pessoas olhassem para essa campanha e para além de convencer os jovens criativos, pensassem: “O Fábio Paim, há quanto tempo?”. E é engraçado que está a acontecer isso mesmo. Ele voltou a aparecer, está conversando com várias equipas, voltou a treinar… na entrevista ele disse isso mesmo: “Esta campanha fez-me voltar”.
foi o rastilho de uma viragem…
Acho que a história dele ainda não acabou mas acho que está no bom caminho…
Se me perguntassem hoje qual é a campanha da minha vida, se tivesse que escrever o “capítulo dois” eu acho que nesse ano foi a melhor coisa que fizemos. A campanha do Fábio Paim foi mesmo uma “pedra atirada na perfeição ao vidro”. Se sabíamos que isso ia acontecer assim? Foi muito difícil achar o Fábio Paim, teve uma altura que começámos todos a pensar em alternativas… a Ana Paula Costa, nossa cliente da MOP, que patrocina os “Young Creatives” disse: “Será que não está na hora de a gente procurar outra coisa?” Por pura teimosia, eu falei: “Não, não, não. É o Fábio Paim. Tem que ser com ele. A gente vai achar! Estou conseguindo o contacto dele!” (Mentira! Não tinha nada…)
Porque alguma coisa me dizia que aquilo era uma coisa especial!
se pudesse visitar qualquer outra agência, nacional ou internacional, qual seria e porquê?
Sabem que eu sou um grande fã da publicidade de antigamente. A publicidade evoluiu de varias formas mas acho que a essência dela ainda é a ideia, e a venda da ideia. Então, eu gostaria de visitar a DDB dos anos sessenta. Quando eles inventaram a publicidade com a ideia, arriscavam na publicidade que falava a verdade, que desafiava as pessoas. Mesmo porque eu acho que trabalhar de fato e gravata igual ao Mad Men deve ser genial (risos). É o meu lado fã do James Bond falando…
Tirando isso, eu tenho agências que gosto muito. Acho que a Wieden + Kennedy é o máximo e como também gosto de correr e sou um grande fã do Nike Plus, acho que gostaria de visitar a R/GA. Mas…! Para mim, as agências dos anos sessenta são o meu big dream! (risos)
ao longo do seu percurso, qual foi o melhor conselho que já recebeu?
O melhor conselho que eu já recebi…
Eu trabalhei com um cara chamado Ruy Lindenberg, que é um grande criativo da publicidade, no meu primeiro estágio, que me disse uma coisa que foi certeira: “Nessa profissão você demora pelo menos 15 anos para ter a coisa mais importante que existe: o critério”. E é mesmo.
Porque o critério é o que você precisa para agarrar numa coisa e falar assim: “Isso é uma porcaria” ou “Isso vai ser um sucesso”. O exercício do critério serve para tudo: as brigas que você compra, as coisas que você deixa passar, as coisas que você não deixa passar, “Nessa daqui a gente vai até ao final”, “Não, esse realizador é melhor para esse filme por isso, por isso e por isso”. Serve para tudo, em todas as áreas das nossas vidas. Eu faço o exercício do meu critério todos os dias com as minhas filhas. Todos os dias elas pedem para comer chocolate. Um desses dias eu tenho que dizer sim. Qual deles? À sexta-feira? Quando elas se portam bem? Mas se eu deixo o chocolate para quando elas se portam bem será que elas vão achar que têm de se portar bem para receber recompensa?
O Cláudio Carillo, com quem trabalhei, me disse uma coisa que pautou minha carreira para sempre: “Leão de Ouro, ganhar prémio… é ótimo! Mas o dia em que você fizer uma campanha que vai para rua e todo o mundo falar dela, algo de que as pessoas gostam – não são os publicitários, são as pessoas – você nunca mais vai querer outra coisa na vida.” E é a mais profunda das verdades.
O sucesso de público é ainda mais viciante que o sucesso de crítica. Eu fiz uma campanha no Brasil que toda a gente via e falava, que a minha mãe falava para as amigas dela “Foi meu filho que fez isso”. Eu tento repetir isso aqui e sempre. Por isso eu estou sempre dizendo: “Tem que ser aquela pedra que acerta na vidraça, que todo o mundo adora”. Achar isso não é fácil, mas se fosse fácil todo o mundo fazia.
se não fosse, profissionalmente, o que é hoje, o que seria?
Eu acho que gostava de ser detective. (risos)
Gostaria de ser detective ou espião, assim… tipo Jason Bourne. Ou então escrever sobre isso…
Tenho essa ideia romântica de que ser escritor é uma profissão de sonho. O que mais gosto é contar histórias. Agora para as minhas filhas eu leio os livros do Harry Potter mas antes, eu colocava as minhas filhas para dormir e a minha filha mais nova me dizia: “Inventa uma história, pai”, “Ah, tá bom, do quê?”, “A princesa que andava de cavalo.” E aí eu ia inventando, dormia no meio… E me divertia muito!
E quando digo que gostava de ser detective… acho que o trabalho de detective tem muito a ver com a publicidade… tentar achar uma resposta para várias coisas. Vocês viram a “Rapariga com o Dragão Tatuado”? Eu adorava fazer aquilo! Resolver um quebra-cabeças daqueles. “Eu queria ser assim, mas sou assim e está tudo bem” (risos)… já fiz as pazes com essas coisas e estou muito feliz assim.
falando de música… a música é importante no processo de trabalho?
É. Muito. Tenho um amigo que me diz assim: “Quem gosta de música, gosta de cinema”.
Tento sempre estar a par das coisas novas mas acabo sempre voltando para os The Doors e bandas sonoras que escuto sempre.
se pudesse fazer um mix-tape, quais seriam as músicas que escolheria para o inspirar?
Enquanto estou trabalhando escuto muito a banda sonora do “Beleza Americana”. Tem ali um efeito Pavlov em mim que me faz concentrar. Não sei porquê, talvez porque gosto muito do filme também. Uma das minhas cenas preferidas é no final do filme, quando ele morre e fica a ver os momentos da vida dele.
Mais… gosto muito de Tom Jobim e acho que se os The Doors ainda existissem e continuassem fazendo música eu estaria sempre comprando os CD’s deles. O Bexiga ali é que gosta de umas coisas mais “moderninhas”.
Bexiga: Eu sou um gajo moderno. (risos)
Eu acho moderno demais para mim. (risos)
No Brasil tem uma coisa diferente de Portugal. Tem muita gente que trabalha como criativo com cinquenta, cinquenta e cinco anos… são os caras que não estão ali para a reforma, trabalham mesmo. Um deles era o Hugo Correia, com quem eu e a Mari trabalhámos. O Hugo era mesmo da velha guarda. Eu o admirava e virei grande amigo dele. Era a imagem romântica que a gente faz dos publicitários. Era o cara mais calmo do mundo mas tinha uma manda: a única coisa que o deixava possesso era não poder ir tocar no ensaio que fazia às quartas à noite. Ele ficava passado e me dizia: “Seu negócio é cinema, talvez não entenda o que eu vou-te falar: música é a maior paixão que existe e é uma coisa para a vida. É um vício”.
Eu tento me manter informado, mas a música para mim é mais um complemento de coisas que eu gosto.
e quem, de um modo geral, o inspira?
Eu e o Bexiga fomos entrevistados pela Archive há… um ano talvez?
Bexiga: P’rai…
E meio por acidente eu dei uma resposta que acho que responde exatamente a essa pergunta. A maior fonte de inspiração que a gente tem aqui é a Meryl Streep. Porquê a Meryl Streep? Porque tudo o que ela faz, ela faz bem, independentemente do contexto. A Meryl Streep tanto faz o papel digno do Oscar no “Diabo veste Prada” como faz o “Mamma Mia!” ou a “Dama de Ferro”. Só o facto de ela entrar no filme faz com que o filme suba uma categoria. E temos de ser assim. Ter esse profissionalismo e essa entrega para o trabalho, não importa qual seja. Eu sei que é uma situação que é preciso explicar (risos) mas essa postura dela me inspira.
quais os lugares que o inspiram?
Lugares… eu já falei para vocês que eu adoro filme de espionagem (risos). Então minha cidade preferida é Paris.
Depois, eu penso muito enquanto estou em movimento. Às vezes faço essas pausas e ando para cima e para baixo, para cima e para baixo. Acho que a mudança de cenário nos ajuda a mudar de pensamento também. Aristóteles definiu isso, o pensamento peripatético. Ele e os filósofos dele andavam ali por Atenas, falando… Estar em movimento me ajuda a pensar.
Já não bebo, já não danço, drogas também não eram a minha cena, os únicos vícios que sobraram foram o café e aquelas cigarrilhas ali, que também são uma óptima maneira de tentar achar novas soluções para problemas. (risos) Sem contar que eu também sou um grande fã do Clint Eastwood… (risos)
e lisboa? o que lisboa tem de bom?
O que é que Lisboa tem de bom? Vou começar pelos clichés. Lisboa tem uma luz… (pausa) No Brasil tem essas duas categorias de lâmpadas eléctricas – 110 e 220, que é muito mais forte – óbvio, não é? E acho que Lisboa tem uma luz 220.
Eu e o Anselmo, esse meu amigo que me recomendou para cá, quando trabalhávamos juntos inventámos um personagem, um detective e fazíamos umas historinhas. No Brasil tem umas bolachas de água e sal que se chamam Tostines, uma marca super-conhecida no Brasil. Eu sempre comprava essas bolachas e daí inventámos esse personagem, um detective chamado Tom Stines (risos). Me lembro dele falar: “Você vai adorar Lisboa porque Lisboa é a cidade mais “Stines” que existe”. Ela tem, de facto, essa aura romântica, misteriosa, no ar. Em Lisboa eu me sinto de férias, sempre. Mesmo quando eu estou trabalhando.
No mesmo patamar de Lisboa eu colocaria Paris – pelas razões óbvias – e o Rio de Janeiro, que é uma coisa completamente diferente de todo o resto. Numa segunda divisão talvez Nova Iorque, Roma e Londres… que são outros clichés…
Lisboa é das cidades mais bonitas. Eu estou sempre fazendo umas fotos da minha janela. É sempre a mesma janela e são sempre fotos completamente diferentes. Lisboa nunca é igual. Tenho esse privilégio de morar de frente para o Tejo e aquilo muda completamente de 15 em 15 minutos. Completamente. A luz, tudo, tudo, tudo. Até ao final do ano quero fazer um filme stop-motion com isso. Já tirei quase duzentas fotos. Quando coloco no Facebook, os comentários são tão divertidos: “Pôh, de novo a mesma foto?”, ou então: “Ah, eu nunca vi isso!”.
Acho que os clichés são uma verdade repetida muitas vezes. E a luz de Lisboa é mesmo uma coisa i-m-p-r-e-s-s-i-o-n-a-n-t-e!
quais são os seus locais de eleição em lisboa?
Eu adoraria morar no Jardim das Amoreiras. Eu acho que… fazia duas horas de eu estar pela primeira vez em Lisboa quando eu passei por ali. Acho aquele lugar uma cápsula do tempo.
Também gosto do Parque das Nações. Eu paguei pela língua, porque quando a minha mulher disse: “Vamos mudar para o Parque das Nações?” eu falei: “Se eu quisesse isso, eu ficava em São Paulo”. Mas eu acho aquilo maravilhoso, maravilhoso.
Acho que o Chiado, como é óbvio, é um lugar especial.
Mais… já não faço isso tanto quanto gostaria, mas adoro andar por Lisboa. Tem um jardim que eu descobri há pouco tempo que é o… Como é o nome daquele jardim lá ao pé do aeroporto?
Bexiga: José Gomes Ferreira?
Não, não, não… aquele… dos murmúrios…?
Bexiga: Não é aquele que tem os postes coloridos?
Não é esse… bem, talvez seja esse. Eu para convencer as minhas filhas a ir lá eu digo que é o “Parque Misterioso” (risos). Lisboa tem essas coisas: é uma cidade bem arborizada e as coisas são meio escondidas. É, acho que são esses os meus lugares de eleição.
slideshow no escritório de marcelo lourenço
para terminar… dois desafios:
desafio #01:
o que não pode faltar no escritório?
O desafio foi colocado e Marcelo desenhou – com uma caneta preta – o vício que o acompanha desde sempre na publicidade… o Batman.
desafio #02:
e… o que sente o marcelo quando está no seu escritório?
Com bom humor, escreveu uma frase de Luke Sullivan. Obrigado Marcelo!