filipe fangueiro & paulo de amorim meixedo

diretores da DSection

Falar da Rua do Carmo é falar dos diferentes compassos do mundo que por lá passa, trilhando a calçada que tantas e velhas histórias nos murmura. É falar no som metálico que dá voz a Santa Justa, da passagem rendilhada que parece flutuar sobre os telhados, do ritmo das (tantas) janelas e das fachadas onde o fado se entranha.

Foi através de uma destas fachadas de uma rua tão secular quanto cosmopolita que numa tarde de céu indeciso, entre o azul e o cinza, entrámos nos bastidores do mundo da moda.

Filipe Fangueiro e Paulo de Amorim Meixedo são os diretores da revista DSection, a primeira revista de moda masculina portuguesa cujo sucesso tem ido muito além fronteiras. Elegeram a Rua do Carmo para morar, nos entretantos das inúmeras viagens que a revista lhes desenha… e escolheram a sua casa para ser também espaço de trabalho que tantas vezes só termina de madrugada, no final de mais uma ligação internacional, via Skype.

Entre Filipe, Paulo e o adorável Toninho, falámos da paixão por Lisboa, de como tudo começou… Sob a voz quente de Billie Holiday e ao abrigo do conforto pombalino, revelaram paixões, inspirações e confiaram-nos segredos… numa tarde regada a ginja e chocolate.

DSection magazine

slideshow na casa de filipe fangueiro & paulo de amorim meixedo

 

para começar… quem é o filipe? quem é o paulo? quem são os dsection?

Filipe: O Filipe nasceu no dia 23 de Novembro de 85, na Póvoa de Varzim, onde sempre estudou até aos seus 18 anos. Tirou Jornalismo no Porto e achou que esse era o caminho a seguir… e seguiu, nos cerca de cinco anos do seu percurso académico e nos cinco anos que se seguiram após terminar a licenciatura, em 2007. Estive sempre na área do Jornalismo e nunca, nunca, tive ligação com a moda. Era apenas um interesse pessoal. De vez em quando sentia-me interessado em ver alguns sites e conhecer algumas coleções mas nunca foi nada que me levasse a pensar que este era o meu mundo… mas aconteceu e em 2010 surgiu essa ideia, a de criar a DSection.

Paulo: O Paulo nasceu há vinte e três anos, em Viana do Castelo, onde fez os seus estudos na área das artes. Era um miúdo extremamente rebelde (risos)… Em 2007 vim para Lisboa, estudar Design de Comunicação nas Belas Artes. Foi um percurso de algum modo já ligado à moda, uma paixão antiga de certa forma adormecida, porque não era algo muito aceite na terra onde vivia. Quando acabei o curso de Design de Comunicação comecei a estagiar numa revista de moda alemã sediada em Lisboa, a Zoot Magazine. Na Zoot, fui trabalhar na parte da produção e não para fazer design. A direção apercebeu-se disso e ao fim de três, quatro semanas já não estava como estagiário, estava como editor. Isso despertou em mim uma vontade, senti que tinha de fazer alguma coisa na área da moda.

Entretanto, a Zoot decidiu que era altura de regressar para a Alemanha e saiu de Portugal. Nessa altura, tanto eu como o Filipe estávamos com trabalhos pendentes, coisas temporárias… e surgiu a DSection, na altura apenas online, como um site. A intenção era a de criar uma revista, apesar de termos esse sonho de materialização como objecto. O site existia como plataforma, porque acreditamos que o futuro é digital, é online.

Filipe: Eu já tinha trabalhado também num grupo de revistas e sabia, mais ou menos, como era a mecânica – o que era necessário ter e fazer, todos os passos para ter uma revista impressa. Tínhamos também a noção do que o público ainda não tinha. Na altura comentámos: “Não existe nenhuma revista, em Portugal, ou pelo menos uma plataforma online, dedicada ao mundo masculino. Existem sites de outras revistas masculinas, dedicadas ao mundo masculino mas a todas as outras áreas e não tanto, e especificamente, à moda”. Quisemos focar-nos nessa área da moda, do design, quisemos que fosse esse o caminho. Não pensámos: “Vamos fazer uma revista impressa”. Como o Paulo disse, pensámos primeiramente num site.

Paulo: Mal nós sabíamos que o site nos ia ocupar a tempo inteiro, que ia ser a nossa vida.

Não era algo que fosse credível, principalmente em Portugal. A nossa família apoiou-nos desde o início e penso que isso foi a base para tudo. Mas mesmo os nossos amigos diziam: “Têm a certeza? É muito arriscado, nos dias de hoje… Moda para homens, em Portugal?”. Existiu sempre essa nossa batalha, a de continuar a acreditar. O Filipe diz muitas vezes em entrevistas que até hoje nós nunca acordámos. De certo modo, ainda estamos a sonhar… Se nós continuarmos a acreditar que isto é um sonho, e que nos sonhos se pode fazer tudo o que nós quisermos, o projeto existe.

Entretanto a revista online começou a ter uma enorme aceitação e a ter, principalmente, visualizações estrangeiras. Começámos também com entrevistas a personalidades masculinas…

Filipe: Sim, optámos por não fazer uma plataforma de press-releases. Havia crítica escrita por nós. Escrevíamos sobre design, arquitetura. Entrevistávamos arquitetos sobre certas obras que considerávamos interessantes, entrevistávamos fotógrafos, manequins, fazíamos produção de moda – conteúdos exclusivos para o site. Não fazíamos simplesmente como muitos blogues fazem e, provavelmente, isso foi o que trouxe mais procura da parte do público, tanto nacional como internacional.

Começámos por escrever em português mas depois tínhamos pessoas a dizer: “Gosto muito do que vocês têm mas não percebo nada…”. É muito limitativo quando tu escreves numa língua como o português. Então começámos a escrever só em inglês.

Paulo: O nome DSection surgiu… bem, no inicio tínhamos aquela ideia: “Vamos por qualquer coisa com “man”, qualquer coisa ligada ao mundo masculino”, mas era tão cliché. Mesmo as revistas internacionais têm quase sempre a palavra “homem” ligada ao título. Então pensámos: “Vamos inventar um nome!”. Tentámos tudo, mas o nome não aparecia. Um dia, um amigo meu que é médico e que trabalha no estrangeiro, sugeriu a palavra “disection” – dissecar. Resolvemos brincar com a palavra – o que até hoje nos faz sofrer porque as pessoas separam a palavra e quase sempre escrevem D (traço) Section, D (ponto) Section. (risos) Ficou DSection, um nome que soa mesmo a nível internacional.

Filipe: E assim nasceu o site! Fizemos uma mini-festa de lançamento e lançámos o site à meia-noite do dia 4 de Março. O site foi programado para ficar online a essa hora, foi giro!

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e quando é que o site se torna revista?

Paulo: Foi numa altura em que o site já estava a funcionar. Fizemos uma pequena viagem a Paris com um amigo nosso que é manequim, o Mauro Lopes. Na viagem, em conversa, quisemos cometer a loucura de fazer um shooting em Paris, à grande e à francesa! Quem é que não quer fazer um shooting em Paris para uma revista de moda? Fizemos trinta por uma linha para contratar fotógrafo, que não tivemos até ao próprio dia de manhã. Conseguimos as roupas, showrooms e tivemos o apoio das agências. Correu bem e fizemos o shooting, que iria para a plataforma online. Até que – e agora a história que se repete – conhecemos, por mero acaso, o Nicola Formichetti. Foi ele o impulsionador.

Filipe: Ele deu-nos um click. Nós já tínhamos recebido algum feedback estrangeiro, íamos recebendo emails de Nova Iorque ou Los Angeles de pessoas que tinham visto o site e que perguntavam onde é que podiam comprar a revista. Na altura respondíamos que era simplesmente um site, não era suporte de nenhuma revista física mas, de facto, começámos a ver que existia procura e que se tivéssemos um produto físico talvez resultasse.

Paulo: Quando conhecemos o Nicola foi quase como perder o medo. Com ele tivemos a oportunidade-chave, a hipótese (rara) de uma coisa pequena se tornar grande.

Na altura pensámos: “Ele está-nos a fazer um favor porque somos fãs, mas dá dois passos e logo se esquece do assunto”. Tínhamos a noção de que aquela pessoa era “só” o diretor criativo de uma das maiores estrelas mundiais, a Lady Gaga, mas naquele momento o que pensámos foi: “Ele é diretor criativo da marca Thierry Mugler” – o que para nós é extremamente importante por ser uma casa francesa com anos e anos de história. Naquele momento era nisso que estávamos focados. A ficha nunca nos caía, não pensámos que ele era best-friend da Lady Gaga e que tinha uma influência enorme, uma legião de fãs… essa ficha caiu no momento em que ele se mostrou interessado em fazer qualquer coisa connosco.

Filipe: Foi nessa altura que decidimos que, caso se fizesse alguma coisa com ele, seria para ele ser capa – algo realmente exclusivo.

Paulo: Ele próprio nos confessou que nunca tinha saído numa capa e que seria a primeira a nível mundial, o que nos deu ainda mais coragem para avançar!

Filipe: No dia 31 de Agosto de 2011 a capa foi divulgada na Internet. Quando a revista saiu, no dia 8 de Setembro, foi o próprio Nicola quem divulgou primeiro, nas redes sociais. Ele tinha muitos seguidores, inclusivamente portugueses no Twitter e no Facebook e ao colocar “A primeira revista portuguesa de moda masculina, comigo na capa”, imensas pessoas começaram a seguir a revista. Uns dias depois nós fazíamos um search na Internet e era só blogues, blogues e mais blogues a falarem sobre a capa, sobre o Formichetti e a primeira revista de moda portuguesa… aí começou a assustar um pouco!

a cair a ficha…

Paulo: Sim, aí é que nos assustou mesmo porque fazeres uma primeira revista… ok, podes ficar por aí. Lançaste o teu projeto a nível do papel mas podes continuar online. Fizeste aquilo quase como uma realização pessoal.

Mas existiu feedback positivo por parte de quem trabalhava na moda: “E a próxima? Quem é a capa da próxima? Quem é que sai na próxima?”. Aí questionámo-nos: vamos fazer disto vida ou não? Definimos o budget, fizemos as contas a longo prazo, claro! A nível de publicidade era muito difícil conseguir ter publicidade numa revista nova, em papel, independente. Não pertencendo a um grupo éramos nós que andávamos a bater porta a porta, não tínhamos nenhum comercial. Na altura não percebíamos nada da área da publicidade e éramos, como costumo dizer, inocentes na “boca do lobo”. Lembro-me de nos dizerem “Pagamos isto” – e tu ou aceitas ou não aceitas, porque não tens experiência de mercado. Passámos a ganhar essa experiência de mercado à relativamente pouco tempo. Também já não somos nós que tratamos dessa parte…

Entretanto a revista passou para uma segunda fase. Foi o próprio Nicola Formichetti que nos contactou a perguntar se já tínhamos a segunda capa. Na altura dissemos que não, que estávamos a tratar disso e explicámos qual era a nossa ideia. Ele disse: “Ok, eu tenho a pessoa indicada! Vai ser fotografada pelo Mariano Vivanco” e eu: “Calma, nós não temos budget para um fotógrafo desses”. Como o Filipe dizia, podíamos ter esse fotógrafo dali a 10 edições, UMA fotografia dele.

O telefonema acabou ali. Nesse mesmo dia, à noite, tínhamos o Vivanco a ligar. Foi daqueles momentos que tu guardas para o resto da vida. O Filipe é a única testemunha de como eu tinha a cara naquele momento… Tens um ídolo teu, ao telefone, a falar contigo e a dizer-te: “O Nico disse-me que tu querias umas fotos”; Eu: “Sim, quero”; Ele: “Ok, quinta-feira já vamos fotografar, tenho tudo marcado, sexta-feira dou-te as fotos”. Nessa sexta-feira estávamos a falar com o Vivanco via skype, a escolher as fotos, a tratar de tudo…

Filipe: A partir daí tudo se tornou mais fácil. A edição com a capa do Nicola esgotou em Nova Iorque. Foi aí que vimos que tínhamos realmente um público, apesar de ser um público de nicho. Sentimos que estávamos a contribuir para alguma coisa, quanto mais não fosse no género de publicações que se faziam em Portugal. Uma revista portuguesa ser falada em blogues e sites internacionais, ser citada por pessoas que têm um peso muito grande no mundo da moda é raro. As pessoas terem conhecimento de que “talvez” haja moda em Portugal é engraçado.

Paulo: Foi difícil para nós. Sempre que dizíamos que éramos de Portugal a aceitação, mesmo por parte das agências de publicidade (e nós estamos a vender a nossa parte de publicidade praticamente toda a nível internacional). Muitas delas diziam: “Têm Portugal escrito na capa. Meus caros, pedimos imensa desculpa mas não fazemos publicidade em Portugal”.

Filipe: Éramos considerados revista portuguesa e existem marcas que não têm muita presença em Portugal e por isso, diziam que não queriam estar a apostar apenas no mercado português.

Paulo: Mesmo que tivesses provas de que a revista era vendida noutros pontos do mundo…

Filipe: Sim, mesmo que disséssemos que vendemos em sítios como a Colette, Tate Modern, que estamos em 20 países. Decidimos, apesar da revista continuar a ser portuguesa – porque é feita por nós e a sede é em Portugal – deixar de ter o Portugal escrito na capa. Para nós é-nos completamente indiferente e para as pessoas também deve ser. Os conteúdos são exatamente os mesmos. Continua a existir conteúdo português na revista. Em todas as edições nós primamos por ter sempre alguma coisa portuguesa – desde um designer, arquiteto, peças de design, sapatos… portugueses.

Paulo: Já não nos apresentamos como revista portuguesa. Apresentamo-nos como diretores de uma revista internacional, porque esse pormenor já nos custou muito.

é incrível como um detalhe na capa faz tanta diferença.

Paulo: Faz toda a diferença. Por exemplo, estamos a lutar muito para ter connosco uma grande marca que nos disse logo que apesar de ter lojas em Lisboa e ainda estar prevista a abertura de uma outra, o mercado da marca não é português. A DSection podia estar em cento e tal lojas de Nova Iorque, em quase duzentas em Londres, estarmos ao pé das Vogues, Dazzed’s, I-D’s e por aí fora, que ainda continuava a ser conotada como a revista que saiu de Portugal. Ainda há que batalhar, é um processo lento.

Filipe: É mais pela aceitação das próprias marcas porque para o público não existe diferença nenhuma. O público que compra a DSection não é por ser portuguesa, espanhola, asiática.

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apesar de vocês, obviamente, trabalharem muito fora de portugal, aqui é o espaço de confronto das vossas ideias, onde elas nascem… porquê aqui – em casa – e porquê nesta zona de lisboa?

Paulo: Quando vim para Lisboa pela primeira vez, com 17 anos, vim viver para a Rua 1º de Dezembro, já aqui ao lado. Vim para um prédio de estudantes Erasmus, que até era um prédio muito calmo (risos). Depois a vida que o Chiado nos dá não é igual à vida que Benfica, ou Entrecampos nos dão. Até mesmo a vida do Príncipe Real não é a mesma, apesar de adorar o Príncipe Real. É o Chiado! É viveres no coração de umas das cidades mais bonitas do mundo… e eu passei os meus últimos seis anos aqui. Nunca me passaria pela cabeça sair do Chiado. As minhas experiências começaram todas aqui, a minha vivência foi aqui… e acho que para o Filipe é a mesma coisa. Quem vive uma vez no Chiado não quer trocar!

Filipe: Além disso, o facto de teres um espaço no coração da cidade, na Rua do Carmo, facilita. Se alguém te pergunta: “Onde é que é o escritório DSection?” basta dizeres que é na Rua do Carmo que toda a gente conhece, sabe onde é, não tens de mandar mapas nem dizer mais nada. A localização é magnífica. Foi fulcral… e depois o espaço agradou-nos particularmente.

Paulo: Chegámos a procurar escritório mas sentimos que não valia a pena. A maior parte das pessoas que trabalham connosco, apesar de serem da nossa equipa, são freelancers e muitas coisas se resolvem por telefone ou via skype. Passamos a maior parte do tempo fora – viajamos para aqui, fotografamos ali… ter um espaço onde nos sentimos mesmo em casa dá-te conforto. Não é aquela correria de um escritório. E é mesmo isso, é termos o nosso cantinho, que também dê conforto aos nossos amigos quando vêm cá e que melhor lugar que a nossa casa? Por exemplo, a nossa editora de moda é portuguesa mas vive em Paris e está sempre cá metida… (risos) passa aqui os dias connosco.

e como fazem a fronteira entre vida privada e a vida profissional?

Paulo: Eu acho que deixei de ter vida pessoal…

É aquela situação: tens uma revista ainda para fazer, uma edição a ser preparada e aquele momento em que tu te queres sentar, estar no sofá, pensas: “Tenho de marcar reunião com “não-sei-quem”, responder ao email de “não-sei-quem”… Depois os estrangeiros parecem que não dormem! Os americanos não dormem, estão quase 24h no email e claro, não podes dizer que não. Às vezes são 2h da manhã e estás a receber um telefonema.

Filipe: Esquecem-se do fuso horário. O fotógrafo que fez a capa de Julho vive em Los Angeles e eu estava a falar com ele eram quase 2h da manhã, com ele lá ainda a tratar das coisas. Eu já pensava: “Tenho de ir dormir, está bem? Por favor?”

Paulo: A nível de fronteira entre casa e trabalho tivemos que nos educar a nós próprios. Acordar é àquela hora, já acabar o trabalho… é mais difícil (risos).

Filipe: Tentamos acabar por volta das seis e meia, sete…

Paulo: Ah! E obrigamo-nos sempre a tomar o café na rua todas as manhãs.

Filipe: Sim… sais de casa, tomas um café e voltas a entrar.

entram de novo em casa já no “modo” escritório…

Paulo: Esteja a chover, esteja trovoada, vamos sempre ao café Nicola Gourmet, o detrás, pequenino.

Vamos lá desde que estamos cá em Lisboa. As pausas são obrigatórias, o jantar é obrigatório, o almoço e o lanche são à mesma hora. Só a hora de acabar o trabalho é que não.

da rua do carmo até 20 países… como é que se gerem estas coisas, profissional e emocionalmente?

Filipe: No início é muito complicado. Eu tenho 27 anos e o Paulo tem 23. Na altura que arrancámos ele tinha 21 e eu tinha 25, portanto, éramos dois jovens sob uma enorme pressão, a trabalhar para um público muito exigente. Trabalhamos com pessoas que têm egos enormes, o que às vezes ainda é mais complicado de gerir. Trabalhamos com nomes que vão influenciar outros públicos e que te podem ou não “matar”. No início foi muito complicado gerir essa pressão. Não te digo que agora já não seja, mas já conseguimos gerir melhor. Quando recebemos fotografias de seguidores, de leitores que compram a revista, por exemplo, em Nova Iorque e mandam a foto deles com a revista…

Paulo: É o maior presente que podemos receber.

Filipe: Ainda hoje, passadas tantas edições, ainda me diz qualquer coisa. Porque é uma coisa que nasce aqui, vai ser impressa ali, vai para Paris para ser exportada, chega ao destino e houve uma pessoa que comprou e tirou uma fotografia para te enviar a ti! A mim, isso ainda me diz qualquer coisa.

Paulo: Não vamos dizer que não houve vontade de desistir, mesmo com a revista feita.

houve essa vontade?

Paulo: Muitas vezes. Mesmo na segunda, terceira edições… a pressão tornou-se muita! Estás a lidar com distribuidores, exportadores, clientes, compradores… tens que gerir egos, acima de tudo.

Não estamos a falar tanto das marcas, porque essas sabem bem o trabalho delas, mas quando falamos de fotógrafos, por exemplo, mesmo que tu tenhas um orçamento e eles o aceitem o pensamento deles é muito este: “Sou fotógrafo, faço o que quero”. Muitas vezes pensámos que ainda não éramos ninguém e que não podíamos correr determinados riscos. Mas é nessa altura que tens que aprender a dizer “não”. Se tu não gostas daquilo, não vais fazer. Isso foi sempre a nossa base: aprender a dizer não.

Filipe: Aprender a dizer não e a nunca aceitar um não! (risos)

Paulo: Sim, se ouvimos um não uma vez vamos repetir várias vezes até a pessoa dizer que sim. (risos) Nem que ceda por pressão. É um projeto nosso e conseguimos ultrapassar as alturas em que apetecia desistir. Muito se deve aos nossos pais, que viram pelo que nós passámos e incentivaram sempre para continuarmos. Foram os grandes impulsionadores.

já houve tanta dedicação!

Filipe: Sobretudo no início, quando passava quase tudo por cima de nós. Chegávamos a ter trabalho de tal forma que não havia nada – não havia sábados, domingos, feriados.

Paulo: Nessa altura o tempo para a família e amigos desapareceu.

Filipe: Completamente! Agora já temos pessoas que escrevem para nós. Decidimos tudo na mesma, somos nós que tratamos de tudo: que roupas, coleções e marcas é que vão sair, somos nós que fazemos o casting de todos os manequins, juntamente com os fotógrafos de cada shooting. Somos nós a tratar disso tudo. Temos também a parte criativa de pensar “queremos isto assim”, mas também deixamos alguma criatividade para as pessoas que estão a trabalhar connosco.

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falando do espaço… o que consideram essencial no vosso espaço de trabalho?

Paulo: Luz, muita luz, de preferência natural. O nosso apartamento anterior era uma casa mais pequena, mais baixa e não tinha tanta luz natural. Nesta, de manhã até ao sol se pôr tens sempre luz e isso até te dá mais vontade de trabalhar, é inspirador… Depois somos adeptos do branco – apesar de eu nunca vestir branco, acho horrível (risos) – e a casa tem bastante. Estivemos agora no hotel La Maison Champs Elysées da Martin Margiela em Paris e o hotel é maioritariamente branco. Chão, tecto, portas… tudo. Cadeiras, mesas, telefones, computadores, tudo forrado a tecido branco…

Filipe: Tudo branco, tudo, tudo, tudo! Até os quadros estão tapados com tecido branco. Se quiseres ver as fotografias tens de levantar.

Paulo: Mas é extremamente confortável! Não é um espaço nada frio e depois tem aqueles contrastes: ao lado, o quarto é todo preto!

e que outras qualidades são importantes em termos de qualidade espacial?

Filipe: É importante termos um apontamento de natureza, pequenas coisas que te fazem sentir que o ambiente à tua volta é menos artificial. Quando falamos de criatividade, do processo criativo, temos de estar confortáveis.

Paulo: E o espaço tem de estar sempre arrumado.

Filipe: Sempre impecável.

Paulo: Senão não consigo trabalhar.

Ambos: Música: sempre!

Paulo: Isso é obrigatório. O silêncio a mim incomoda-me… bastante.

Filipe: Também não consigo pensar no silêncio.

que objetos não podem faltar quando estão a criar, a trabalhar?

Paulo: Os meus cadernos de apontamentos são essenciais.

Filipe:  Apesar de conseguirmos fazer tudo no computador temos sempre…

Paulo: Tudo em papel. A capa, por exemplo, é toda desenhada em papel.

Filipe: O papel para nós é importante. O Paulo veio de artes e muitas vezes desenha a posição em que queremos que o manequim esteja na capa para enviarmos para o fotógrafo e para o stylist. Mais coisas… cadernos, lápis, esferográficas… hummm e mais? Uma vela… dá conforto, é envolvente.

Paulo: E um sofá! Para chegares ao fim do trabalho e… “caíres” um bocadinho. Não te sentas nele durante o dia mas é bom sentires que o sofá está ali à tua espera. (risos) Ah! Também somos viciados em cappuccino caseiro, culpa da Nelly, a nossa editora de moda. É surreal a quantidade de café que nós bebemos. Café caseiro… nada de expresso.

Filipe: Por isso a cafeteira não pode faltar.

Paulo: E é isso… não somos exigentes. (risos)

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e nas vossas mesas de trabalho têm…

Paulo: Os meus óculos, os auscultadores para o Skype

Filipe: Na minha mesa tenho… o meu computador, o bloco de notas e como eu trato muito da parte mais burocrática da empresa tenho dentro desta capa extractos do banco, coisas para pagar, coisas para receber, tudo o que são códigos e passwords para o site do banco, cheques… o telefone tem de estar aqui ao meu lado e às vezes tenho algumas revistas…

Paulo: Sobretudo internacionais.

Filipe: Sim, apesar de serem nossas concorrentes, gostamos de ver.

Paulo: Faz bem ver outras revistas, outro material, porque é daí que nascem ótimas ideias. Nada nasce do nada. A era em que vivemos obriga-nos a estar inspirados noutras coisas. A própria Internet é um mundo. Podes ter vinte páginas abertas e não ver muitas delas, mas o teu cérebro está a receber informação, quer tu queiras ou não. Hoje em dia, mesmo a nível da música, do cinema, há muita crítica, muitas pessoas têm aquela ideia de que o que veem é uma cópia. Eu digo sempre, na brincadeira, que a era das top models desapareceu nos anos 90. Já não existem génios! Vais fazer um rabisco, já o viste noutro sítio e nunca irás dizer que o viste – não “viste”, mas o teu cérebro “recebeu” aquilo.

mas em portugal ainda existe o pudor de dizer “as minhas referências foram estas”. mesmo tendo essas referências as pessoas não referem, têm receio…

Filipe: Sim… há um estigma. Não dizem que têm nem quais são.

se pudessem entrar numa redação de uma revista qualquer qual seria e porquê?

Paulo: (Para o Filipe) Vais dizer a mesma que eu. (risos) Eu entraria na V Magazine, nos Estados Unidos. É uma revista big size, bimensal e foi sempre a minha inspiração. O Nicola foi diretor artístico da revista durante algum tempo e hoje é um dos maiores colaboradores. A nível de revistas, o grupo V é uma das maiores empresas do mundo… uma V Magazine vende muito mais do que uma Vogue americana. Ocupam um edifício inteiro, na 5th Avenue – têm um andar para fotografar, um andar para receber gifts, têm um andar para o diretor, outro para o editor. No exterior têm mupis gigantes com as capas impressas… identifico-me com a revista, mesmo a nível gráfico. A nível de impressão, de fotografia é das melhores que conheço (isto para não falar das asiáticas). Mesmo o tamanho big size da revista funciona porque não é uma revista para levares no metro, é uma revista para guardares em casa, colecionares. Acho que é das minhas maiores referências!

filipe, eleges a mesma revista/redação?

Filipe: Sim-sim. Também gostava muito da Vogue Homme Japan, onde o Nicola Formichetti foi diretor de moda, mas infelizmente acabou. Vai passar a ser GQ Style Japan.

Paulo: Era a única revista masculina que arriscava, em tudo! Se procurasses uma revista que soubesse arriscar era a Vogue Homme Japan. Não tinham medo, faziam o que queriam, tinham liberdade total.

Filipe: Os asiáticos são muitos e são muito mais abertos à novidade. (risos)

Paulo: Nós tivemos ainda maior noção disso com a DSection. Estamos a vender em 5 países da Ásia e as vendas são óptimas. Lá consomem moda até à exaustão, tudo o que é bling bling é consumido. São os asiáticos!

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qual foi o maior e melhor conselho que vocês já receberam ao longo deste processo?

Paulo: Conselho… (pausa) Hummm… pergunta difícil. Talvez o melhor conselho que já recebi foi: “Não te esqueças de onde vieste, não te esqueças de quem és”. É daqueles que vai martelar sempre cá dentro.

Filipe: Eu lembro-me de um conselho do Frederico Martins, um dos nossos fotógrafos: “ Torna-te tão especial que seja impossível ignorar-te”.

Já foi há algum tempo, numa fase em que estávamos mais em baixo mas essa frase para mim foi importante.

Paulo: Há também aquela engraçada do Mariano Vivanco que foi quase como uma brincadeira. Foi numa altura em que estava nervoso, porque a I-D Magazine tinha lançado oito (!) capas ao mesmo tempo que nós, e estava a falar com ele no Skype e ele só me disse: “Um dia serás melhor que a I-D!” (risos) “Não te preocupes, um dia serás melhor. Eles já fizeram tudo o que havia a fazer, tu ainda agora começaste, tens essa oportunidade, essa sorte!”. É sempre bom ouvir estas coisas, sobretudo quando vem de quem vem e faz o que faz, é óptimo.

se não fossem os criadores da dsection, nem jornalista e designer, o que seriam? … e nem arquiteto, paulo, uma vez que nos confessaste em off que pensaste seguir arquitetura…

Paulo: É sempre difícil responder a isto. (pausa)

Filipe: Bem… (risos) Agora que tive noção do que é trabalhar por conta própria, se calhar também faria algo do género. Hummm… não sei dizer de quê, mas talvez gostasse de abrir uma store, uma loja qualquer.

Paulo: Eu sempre quis estar na área artística (pausa)… O passado (pausa) ainda me deixou fazer aí umas brincadeirinhas. Eu com… que idade é que eu tinha?

Filipe: Tinhas 14.

Paulo: Tinha 14 anos. (pausa) Eu nunca falo sobre isto. Nunca falei em nenhuma entrevista, é a primeira vez… acreditem que é a primeira vez. Eu tinha 14 anos e na altura estava a passar uma fase um bocado complicada. Era muito diferente do que sou hoje e sofri imenso bullying devido à minha aparência física. Depois adorava desenhar, desenhava roupas, fazia roupas… pegava nas revistas da minha mãe, punha o papel por cima e desenhava o corpo dos manequins para depois desenhar as roupas. Um dia a minha mãe, na brincadeira, pegou em todos os desenhos e enviou para um daqueles programas da manhã da televisão. Entretanto ligaram-me a perguntar se eu não queria ir ao programa falar sobre aquilo… um miúdo de apenas 14 anos já com uma coleção feita. Primeiramente recusei, achei que não valia a pena, mas a minha mãe disse-me: “Vai porque eu já fiz os vestidos!”. E… fui.

Saiu-me o tiro pela culatra. É muito fácil gozarem com um miúdo naquela idade, ainda para mais eu era obeso na altura. Fui gozado na escola: “Vais à televisão? Isso não é para ti! Não é para homens! blá-blá-blá”… Depois de ter ido à SIC, a RTP ligou-me. Queriam que eu fizesse uma apresentação do meu trabalho! Num desses programas fizeram-me uma surpresa e apareceu o Augustus, que me disse: “Quando acabares o secundário vais trabalhar para o meu atelier. Quero que sejas uns dos meus designers”.

Confesso que me esqueci completamente disso, apesar de ser uma coisa da qual gostava imenso. Custou-me tanto ultrapassar aquela fase, foi dolorosa. Uma fase em que me criticavam, não aceitavam, o meu pai não aceitava… a minha mãe apoiou-me mas viu que aquilo estava a custar-me muito, sobretudo depois de ter ido à televisão. Deixei isso tudo para trás… depois foi a fase da minha mudança física…

Sim, se calhar hoje se não fosse o que sou, talvez fosse designer de moda. Mas não cá em Portugal, isso sem dúvida alguma, porque não vale a pena. Nem agora nem nos próximos 20 anos… acho que tentaria sair do país. (Para o Filipe) Lembras-te que anos depois até entrevistámos o Augustus para a revista onde tu trabalhavas e eu lhe perguntei se ele se lembrava de mim? “A tua cara não me é nada estranha” – ele lá reconheceu, perguntou por onde andava…

Mas toda essa fase desapareceu, foi efémera. Eu disse para mim mesmo: “Vai ficar guardado no baú, nunca vais contar a ninguém”. Quase ninguém sabe… o Filipe sabe, os meus amigos mais próximos sabem.

Filipe: Agora toda a gente vai saber…

Paulo: Agora toda a gente vai saber. Acho que é bom falar disso agora, falar da situação de bullying nesta fase em que já tenho o meu projeto, estando a lutar pelas minhas coisas. Consegues-te afirmar naquilo que estás a fazer e podes dizer aos outros que tenham coragem porque sejam gordos, sejam magros, sejam feios – não interessa – um dia vocês ainda vão FAZER. Nós temo-nos cruzado com pessoas com personalidade extraordinária, com um carácter extraordinário e algumas tu nunca te sentirias atraído por elas se as visses na rua, nunca falarias com elas. Muitas pessoas dizem “Ah! Mas vocês só lidam com manequins.” Não, a nossa vida não é feita de manequins…

Filipe: Sim… pensam: “Ah! Moda… que glamour! Festas aqui e festas acolá”… Festas?

Paulo: Falando em festas, é curioso… eu fiz agora uma pequena festa dos dois anos DSection na minha terra, em Viana e as pessoas que um dia me diziam “Tu és isto, tu és aquilo” e me faziam cair, ter medo de ir às aulas, faziam trinta por uma linha… estavam lá a dar-me os parabéns e a apertar-me a mão. Nunca lhes ia dizer nada porque, para mim, aquilo já é o suficiente. Não guardo rancor, não vale a pena.

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falando de música… se pudessem fazer um mix-tape, neste momento, quais seriam as músicas que escolheriam para vos inspirar?

Paulo: É engraçado porque nós temos sempre uma música associada a cada edição. Numa delas foi quando apareceu a Lana (del Rey). Toda a edição foi inspirada nela, até a nível de tratamento fotográfico. Levámos as músicas dela à exaustão, até dizermos “Agora já não dá mais”. (risos) Nesta última edição os títulos dos editoriais são todos músicas de jazz.

Filipe: E na edição número 2, lembro-me perfeitamente, ouvimos imensas vezes Lady Gaga.

Paulo: Foi na altura em que o Nicola apareceu nas nossas vidas e gostássemos ou não dela, ela surgiu em força, tudo era Gaga. Ouvir aquelas músicas deu-nos um certo conforto, transportou-nos para aquele universo.

Filipe: Ouvimos muito Billie Holiday, ouvimos muito Nina Simone, às vezes também ouvimos ópera, principalmente Maria Callas.

Paulo: Uma vez o Nicola disse que a ópera era a única coisa que o libertava de tudo…  Aprendi a gostar de ópera e considero-a hoje a arte mais perfeita de todas.

quem é que vos inspira?

Filipe: Os meus pais inspiram-me, o público da DSection inspira-me… e há pequenas coisas que me inspiram. Às vezes basta um passeio, vais ali até ao Príncipe Real e olhas para alguém e aquela pessoa inspira-te, nem sabes bem porquê… Uma pessoa que tem um cabelo de determinada maneira e que te inspira a fazer alguma coisa. Às vezes isso acontece.

Paulo: Acontece muitas vezes os manequins inspirarem-nos.

Filipe: Sim, também.

Paulo: Muitos trabalhos nascem das caras que vemos. Às vezes queres fotografar e não tens ideia nenhuma mas olha para aquela cara e dizes: “Não! Aquela cara é para fazer isto ou para fazer aquilo”. Os costumes da minha terra inspiram-me, muito. O Minho, os lenços de Viana, os bordados regionais, a filigrana, tudo isso inspira. A Dolce & Gabbana agora fez a coleção toda com sapatos em filigrana e brincos em API (Alumínio, Pvc, Inox), e não podem dizer que foi inspiração siciliana, porque não foi (risos). Mas sim, já desde o tempo de faculdade o Minho, a ligação com os costumes e tradições inspiravam-me imenso. O nosso país tem muito para dar e as pessoas têm que aprender a ir buscar também o que é nosso…

Filipe: E usá-lo bem, porque muitas vezes o que acontece é: “Ah, o tradicionalismo… que giro! Vou-me inspirar nas coisas tradicionalistas”… e depois exageram, não fica bem, fica tudo uma pirosada! É preciso ter muito cuidado com os limites que crias, ser criativo.

Paulo: As culturas são fonte inspiração. Somos aficionados pelos documentários do National Geographic, do Canal Odisseia, Canal História, apesar de agora só falarem em alienígenas (risos). Os próprios documentários inspiram devido ao conteúdo cultural. Muitas vezes pode ser um mote para fazeres qualquer coisa, para criares.

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já falaram do minho, mais concretamente de viana, já referiram o príncipe real… que outros lugares é que vos inspiram?

Filipe: Lisboa inspira-me.

Paulo: Muito! Cada vez mais Lisboa é uma inspiração, a nível pessoal.

Filipe: Continua a ser uma das minhas cidades preferidas de sempre. Não estive assim em muitas mas…

Paulo: Já estiveste nas maiores! (risos)

Filipe: Nas principais, europeias. Gosto muito de Paris, adoro, mas gosto estar lá 5 dias e…

Paulo: Chega!

Filipe: Acontece-nos isto regularmente. Estou lá 5 ou 6 dias e a cidade começa a pesar-me. Milão não é de todo inspirador, não gosto nada. Londres também não é grande inspiração. Sim, Lisboa inspira-me. Às vezes vamos a um sítio onde já fomos quinhentas vezes mas chegas lá…

Paulo: E é sempre diferente!

Filipe: Não é que seja diferente, continua a ser bom e continuas a dizer: “Ah!” (grande suspiro)

Paulo: Eu sou apaixonado pelo Príncipe Real. Fazemos questão de todos os dias fazer uma caminhada pelo Príncipe Real principalmente quando há aquela feira biológica, ao sábado de manhã. Há ali qualquer coisa. Tudo está tão bem cuidado, tem um jardim, há famílias…

Além fronteiras… Nova Iorque, sem dúvida. É AQUELA cidade que te inspira, das mil e uma músicas, da arquitetura louca… tu olhas para aquela cidade e pensas que aquilo sim, é uma cidade do futuro. Para mim o Dubai não é o futuro. Para mim o futuro é uma caixa de fósforos… uma “Nova Iorque” com centenas e centenas e centenas de pessoas dentro de um único prédio. As coisas acontecem todas lá. Nova Iorque, a nível da nossa área e da área de moda funciona muito melhor. É o que o Filipe diz, Milão nem por isso, Londres nem tanto, Paris… Paris é a eterna cidade romântica, gosto de lá ir…

Filipe: Sim, inspira-nos… de vez em quando. Mas Lisboa é muito mais especial. Não tem a dimensão que têm outras grandes cidades europeias…

Paulo: É apaixonante…

Filipe: Está no tamanho certo sabes? Não é demasiado grande nem muito pequena, está na escala e dimensão certas. A arquitetura é única, não existe em mais lado nenhum. Não tens estas colinas em mais lado nenhum – tens em Roma, mas Roma parece estar aos pedaços.

Paulo: E é tudo tão perto. Nós hoje fomos a pé para uma reunião nas Amoreiras. Não é assim tão longe. Nós em Paris chegámos a fazer quilómetros e quilómetros a pé!

Filipe: Sim, mas em Paris eles não têm noção da realidade. Dizem-te assim: “Ah! É ali!”. E tu vais, andas, andas e nunca mais lá chegas! O “ já-ali” deles são para aí 3 ou 4 quilómetros. (risos) A cidade é gigante.

Paulo: Desta última vez que estivemos em Paris – há três semanas – eu estava constantemente a dizer que me queria vir embora. No momento em que eu vi o avião a passar por cima do Tejo e vi Lisboa senti: “Finalmente! Finalmente estou em casa”. Eu que nem sou daqui senti-me: “Finalmente estou em casa”.

Filipe: Paris estava fria estava chuvosa. Andarmos de um lado para o outro numa cidade com aquela escala, onde tudo é caríssimo… Paris tem esses senãos.
Quem tiver uma vida regrada e tiver um ordenado minimamente bom têm uma vida brutal em Lisboa que não tem em outras cidades europeias. As pessoas que vivem em Paris, em Londres ou Amesterdão têm sempre um senão: ou é tudo demasiado caro ou tudo muito turístico. Aqui estamos num nível q.b. – nem é muito turístico nem muito caro – é na dose certa.

Paulo: E temos mar, que é super importante. Não percebo como é que aqueles parisienses vivem sem mar, só têm aquele rio escuro.

um é de viana, outro da póvoa de varzim… a relação com o mar é muito grande.

Filipe: Sim, exatamente.

Paulo: Eu não conseguiria viver sem mar. Acho piada aos estrangeiros que chegam aqui e dizem: “Vamos para a praia!” e vão para a Praça do Comércio, que agora tem um novo passeio marítimo. Mas é isso, quando vêm cá ficam todos apaixonados… Os nossos amigos estrangeiros quando vêm a Lisboa dizem que vivemos no céu. Um dos nossos amigos é assistente do Riccardo Tisci da Givenchy e um dia disse-me: “Paulo eu invejo-te”, e eu: “Mas tu tens o melhor trabalho do mundo!”, ele: “Mas eu invejo-te porque tu vives numa cidade linda onde tens imenso sol, onde as pessoas sorriem, onde as pessoas são felizes. Paris não, eu quero fugir de Paris!”. Ouvires isto de alguém que tem um emprego que tu sabes que lutou toda a vida para o ter, que vive num sítio magnífico, leva-te a pensar em como o nosso cantinho é especial.

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e para além do príncipe real, que outros lugares são os vossos favoritos em lisboa?

Filipe: Gosto de ir a Alfama de vez em quando…

Paulo: Já passou essa fase Filipe! (risos) Sempre que podemos vamos ao Miradouro da Nossa Senhora do Monte. Detesto o Bairro Alto.

Filipe: Sim, o Bairro Alto é giro mas não todas as noites. É de vez em quando.

Paulo: O Bairro de Santa Catarina é bonito.

Filipe: A Bica…

Paulo: A Estrela, o Jardim da Estrela… e o Miradouro das Portas do Sol, também.

Filipe: É em Alfama… eu estava a dizer Alfama mas estava a dizer mais esse lado! Não era ir para as ruas tirar fotografias às varandas. (risos) Estava a dizer mesmo essa zona, pronto quase Graça. E o Chiado, Rua do Carmo, Rua Garrett, Ivens e por aí…

Paulo: A Rua Ivens foi a minha rua durante muitos anos. Estudei ali e ter a faculdade ao pé de casa tornou-se giro. A minha vida era mesmo “escola-casa, casa-escola”… dormia mais tempo. (risos)

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Obrigado Filipe e Paulo!

slideshow na casa de filipe fangueiro & paulo de amorim meixedo

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